Céu de Quinta-feira

Se o Céu existe,
quero o meu feito de uma Quinta-feira,
mas não uma qualquer,
e sim, uma que seja véspera de feriado,
onde eu possa simplesmente enforcá-la sem mistério,
e com a menor das culpas e pudores.

Neste meu Céu,
cabem muitas coisas inúteis e simples.

Cabe acordar, e ver ao meu lado, inda dorminte,
um bem querer,
seja uma companheira,
ou um ente saído de mim.

Cabe acordar de mansinho, sem alarde,
pra qu'eu possa trazer-lhe um café e uma flor.

Cabe ainda ver o sorriso amassado,
a vergonha do hálito enquanto beijo,
-bom dia-
e afastar aquela mexa, que lhe cobre os olhos, ainda sorridentes.

Cabe abrir a porta e ver o gato sair, e o cão linguarudo,
que olhando de cima parece sorrir,
com sua calda a abanar, aclamando o dia.

Sentir na face e respirar, o ar fresco e ligeiramente gélido,
que na volta forma um vapor bonito de outono.

Cabe ainda escutar,
qualquer ente que pie e se assuste comigo,
ao colher lenha e gravetos para o fogão.

Se justo for este céu comigo,
fitarei com olhar terno e bento,
meu rebento ainda remelento,
com juras de pandorga ao dia.

Cabe ainda,
após fazer crepitar a lenha,
voltar a chafurdar os lençóis e dormitar,
pra acordar novamente,
com ares para outra boa vinda ao dia.

Neste reacordar, que seja com o rebento,
a reclamar as juras de pandorga,
que faremos com as cores mais belas e vivas,
que uma pipa pode ter.

Que o verde abaixo da varanda, seja ainda forte.
E que as flores me inspirem.

Que eu e minha amada, nos entreolhemos,
ela de mãos justapostas sorvendo o líquido quente,
e olhando pra gente, entre varetas e cores,
e que neste, se diga tudo e nada,
por falta e necessidade.

Cabe ainda, nesta Quinta-feira,
que sentemos ao chão e olhemos no céu a pandorga enfeitada,
sendo empinada,
por um ramo forte que envergue,
sem mão nem nada.

Ah. Nesta Quinta-feira,
cabem tantas coisas inúteis...

...pisar na terra,
colher coisas,
fazer mandalas,
cozer pinhão,
fazer café e pão,
afagar o cão e correr com o gato,
olhar pro mato,
sentir tesão,
pintar uma quadro,
dedilhar um violão,
fumar tabaco,
jogar xadrez,
acender uma vela,
fazer cerveja,
tomar um vinho,
escutar boa música,
dançar juntinho,
beijar,
olhar,
sentir,
viver de verdade.

Se o Céu existe, quando eu me for,
quero o meu feito de uma Quinta-feira,
mas não uma qualquer,
um Quinta-feira Eterna em véspera de feriado.

Comentários

☆mnemosine☆ disse…
Edu
sei que é um desejo, inspirado talvez pelo passado, ou pelo desejo de futuro.
Quem sabe seja uma lembrança, a gente pode lembrar o que foi e ainda enfeitar com o que faltou.
Mas sei que esse céu, é o céu que procuro....assim, numa quinta-feira, véspera de feriado, dia de Vênus....

foi bonito entrar nesse sonho
Oi Edu, lindos sonetos.
De Floripa para o Acre, que mudança.

Não conhecia o Tokkou, achei a idéia sensacional.

Abs